5 de maio de 2010
Chamemos-lhes Luísa e Guida, Por Agora (primeira parte)
P - Nasceu com uma deficiência na mão direita e no braço direito e um certo voluntarismo dos seus pais reagiu, um voluntarismo efectivamente espantoso, que foi o de o terem forçado a escrever com a mão direita. Creio que lhe prendiam a mão esquerda atrás das costas para o obrigar a escrever com a mão direita. Hoje em dia, isso seria absolutamente incompreensível!
R - Um sistema familiar ajuda a lidar com pessoas a um nível mais pessoal, mais individual. É uma espécie de sistema de confiança.
Mas o que importa mesmo é que descubras as coisas por ti.
Os outros não têm de seguir a minha forma de pensamento. Até estou mais interessado em que me provem que estou errado em certas coisas. Trata-se de ter uma discussão de forma a nos ensinarmos uns aos outros. É disso que estou à espera, que tragam algo que me ensine igualmente.
Isto parece muito simples, mas na verdade é muito difícil as pessoas sentirem-se confortáveis com isso. Não é que elas sintam que o que fazem é mau, ou descarado, ou pouco valioso. É, muitas vezes, porque aquilo em que és melhor é o que valorizas menos. Então esta liberdade de que falo tem a ver com ajudar alguém a reconhecer que aquilo que faz, aquilo que é lhe é fácil fazer, é exactamente o que devia fazer.
Nunca achei que as pessoas devessem justificar fosse o que fosse. Não percebo isso. A ideia de falar sobre o que se faz, isso eu penso que é interessante. Mas a ideia de que isso equivale a justificar-se, isso já é muito diferente. Oponho-me totalmente a essa ideia.
Isso é o que torna tudo real, isso é o que torna tudo perigoso e vibrante. Isso é o que torna tudo excitante e emocionante. É daí que vem tudo o que torna as coisas importantes. Nada disso vem da procura incessante pelo moralmente correcto.
R - Há com certeza. Mais: Penso mesmo que há possibilidades na minha mente que eu esqueci. Tenho possibilidades das quais me esqueci e tenho que me lembrar porque é que as esqueci.
Não gosto mesmo nada da imitação das coisas.
Mas não posso desprezar as pessoas só porque elas fazem coisas que às vezes estão em contraste absoluto com o que eu próprio penso.
Não tenho que gostar do trabalho, não tenho que me importar com ele. Não tenho que o perceber. Gosto de variedade. Não quero que sejam todos o mesmo.
R - O que geralmente acontece com os estudantes, por exemplo, é que é tudo um pouco sobre contactos, é um pouco sobre diversão, e é sempre uma mistura fácil. É sempre arte, mas nunca é algo realmente interessante. Aconteceu-me algumas vezes que essas pessoas querem uma crítica pessoal passados três anos. E depois dizem-me que estão a pensar parar porque já não lhes desperta interesse. E frustram porque apenas estão a lidar com algo exterior, mas nunca arranjam tempo para desenvolverem as suas próprias coisas. Olhando para portfolios e entrevistando alunos, é relativamente simples de seleccionar porque 95 por cento dos portfolios parecem iguais, vê-se a mesma atitude, os mesmos clichés. Então são convidados para entrevista, e alguns são mais diferentes que outros, e esses são os escolhidos. É apenas sobre diferença.
R – Não. As coisas transformam-se a toda a hora e a imagem que eu vejo não é a que tu vês; nós digerimos as coisas de maneiras diferentes e às vezes a merda sai, outras vezes, não. É neste sentido que eu quero ser mais livre do que antes... Esta é a informação para o futuro. Estou a aprender a dizer “não” às coisas, que não faço parte disto, ou “não vou participar nisso”. Tenho que aprender a dizer não a todas as pessoas que pretendem organizar a verdade da vida. Quero ensinar as pessoas a dizer “não”, “façam isso sem mim, não faço parte disso”.
R - Os alunos não se podem envolver no processo à espera de aprender uma receita de sucesso para a arte ou para o teatro, dada por mim.
Uma vez estava num seminário sobre Beuys e toda a gente tinha uma espécie de arrogância, eles queriam ser uma espécie de apóstolos de Beuys. E eu acho que os apóstolos, na verdade, mataram Jesus. Esse é o problema do ensino.
Pode-se falar sobre arte, ou ensinar os seus contornos exteriores, ou até as circunstâncias, mas por definição é praticamente impossível dizer-lhes o que isso é. Todos os artistas, novos ou velhos, que aparecem na arena da discussão, têm de fazer uma proposta de como entender a arte diferente de todos os outros. Como posso ensinar isso? Posso-lhes tentar ensinar certas estratégias para atingirem algum sítio como esse, mas não lhes posso dizer “é assim que tens de fazê-lo”.
R - A inércia desperta quando usas a arte como uma receita para seres mais interessante do que eras antes.
P - Estás cansado do rótulo de Enfant Terrible?
R - Agora eu aceito melhor que não posso determinar ou controlar o progresso.
P - O ensino e a práctica, na tua opinião, são actividades distintas?
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